quinta-feira, 12 de novembro de 2020

doze.onze.vinte

 Viagem pra Sobral cada vez mais perto. E eu quero votar. A apreensão sobre a possibilidade de não conseguir trocar a passagem pra domingo fica consumindo meu pensamento. Onde está meu budismo nessas horas? A verdade é que essa coisa tão pequena consome também minha coragem de sentar e escrever. Tudo toma minha atenção. Já tem um tempo que decidi considerar o tempo em que trabalho em textos já escritos como tempo de escrita. Antes eu só considerava tempo de escrita aquele em que estou produzindo textos novos. Ainda faz sentido pra mim essa concepção. Mas o tempo em que tento atrair pessoas para meus textos é também tempo de escrita?

Ontem e hoje tive dois sonhos magníficos. Mas o de ontem só me vem como fragmentos que nem consigo descrever para analisar direito. É uma pena. Eu sei que foi um grande sonho. Estava na residência dessa mulher, minha Anima(?). Uma musa intelectual com um jardim cheio de livros e peças de arte e fizemos amor sobre uma mesa de seu jardim. Voltando pra casa, toda minha rua, todas as casas, tomadas por um incêndio cujas chamas queimavam até o chão. Mas eu não queimava. 

O de hoje foi sobre mudança. Eu e meu irmão pequenos sendo obrigados por meu pai a mudar de um quarto para outro da mesma casa em que acabamos de nos mudar. No primeiro tínhamos mais luz e a controlávamos, mesmo durante a noite. Era pequeno, mas aconchegante. O segundo tinha quase o mesmo desenho, mas a vista era limitada, dava para dentro da própria casa e não controlávamos a luz. Eu tentava consolar a mim mesmo e a meu irmão pela mudança. Tentava convencer a nós dois que a mudança tinha suas vantagens.  A interpretação é minha, dei um vislumbre na gravação que fiz (gravo meus sonhos assim que acordo). Fazer isso me ajuda a ligar os pontos, reconhecer símbolos e entender o que meu Self quer me dizer. Havia muito mais nesses sonhos. Estão todos comigo.

Eu deveria estar na reunião da viagem agora, mas foi adiada/cancelada. Não importa, eu já conheço o trabalho. Só quero o dinheiro. Se depositarem, ao inferno com a reunião. 

Realmente não estou conseguindo me concentrar em nada de escrita enquanto as questões dessa viagem não estiverem concluídas. Talvez eu devesse desencanar e simplesmente respirar até o momento em que estiver no alojamento do Pátio de Manutenção em Sobral, olhando pra Meruoca enquanto tomo meu café solúvel de péssima qualidade com meu casaco numa madrugada antes de pegar o trem, pensando na história que vou escrever depois que o expediente acabar. E enquanto isso assistir algo ou engatar a próxima leitura. Há muito o que fazer. Preciso fazer as alterações em "Nuvens Mágicas" que a Efigênia e a Nat me mandaram. Preciso falar algo sobre isso com a Vanessa. Não posso continuar sem uma palavra dela. Preciso trabalhar nos textos que quero disponibilizar no insta. Preciso trabalhar em mais um texto pro concurso Ideal do ano que vem. A lista de tarefas é enorme. 

Eu deveria me torturar tanto pelas redes sociais serem o único jeito que tenho de mostrar minhas coisas? Por ser um meio imposto e não uma opção? Eis um vilão terrível esse pensamento. Sinto que ser refém das redes pra existir é uma opção falsa, no sentido de parecer uma escolha, mas não ser. Como se meu algoz me dissesse: "Não fique triste. Você tem escolha sim! Duas, na verdade. Você pode escolher pular desse penhasco a dois passos ou pode levar um tiro que eu vou te dar se você não pular. E aí? O que você escolhe?". Dramático. Prazer, eu.

Bem, acho que eu já fiz a escolha. Só não admiti que já me joguei. Eu tenho a vista da queda desde o salto até alcançar o chão. A questão é apenas como aproveitar a vista, o vento e a sensação de voo. Chega de metáforas.

O que me incomoda nas redes é precisar produzir algo pensando numa resposta. Meter um filtro numa foto, passar horas fazendo um daqueles cartazinhos no Canvas pra ele simplesmente passar batido e levar uns likezinhos. O que é tudo isso afinal? Sísifo...

Tenho pensado há anos em escrever algo sobre uma conversa de...não sei, acho que era pelos idos de 1999 ou 2000. Estávamos na calçada do Rodrigo, era tarde da noite. Falávamos sobre como o ser humano paga por seus erros. Até parece que esse era o nível daquelas conversas sempre. Mas de vez em quando coisas assim saíam. O Rodrigo, como um católico típico defendia que uma pessoa que comete atrocidades paga na mesma moeda ainda em vida. Àquela época eu também era um um católico, lutando para acreditar em Deus e ter tanta convicção quanto o Rodrigo. E me surpreendi com a possibilidade a favor do absurdo que é a realidade, colocada pelo Nilton. "Eu acredito", disse ele, "que uma pessoa que cometeu as piores atrocidades pode passar impune pela vida e morrer tranquilamente, aos noventa anos em seu quarto enquanto dorme, sem sofrer nada". Imediatamente pensei em Hitler. Ele e outras atrozes figuras morreram de forma violenta e trágica. Mussolini, Rasputin, Kadafi e Hussein passaria por isso depois. Mas essas eram figuras extremas e cheias de ímpeto. Ao longo dos anos a lembrança dessa conversa continuou me perseguindo e fui refinando os exemplos possíveis. Passei a colocar na equação figuras mais sutis. Como morrerá o patrão que massacrou por décadas seus empregados por meio de vários abusos e explorações? (já tive patrões assim). Como morrerá o cara que abusou das filhas e esmagou a voz da esposa por toda uma vida e nunca foi exposto por ser um grande nome na sociedade? Como morrerá o médico do posto de saúde que jamais teve um pingo de empatia por seus pacientes e desde o primeiro momento os tratou como lixo e fez questão de que eles notassem isso e comprassem o pensamento de que realmente são lixo (existem médicos assim. Enfermeiros tb). Enfim, essas pessoas que passam pela vida, pelas nossas vidas sem estarem envolvidos com guerra e política, mas que têm alguma forma de poder e/ou dinheiro e seguem pisando nos outros num salve-se quem puder, desde que seja eu e não você. A fala do Nilton me marcou de modo a olhar pro mundo e pras maldades que são cometidas contra o próprio mundo, olhar pros seus autores e pensar: "Ele vai se safar dessa?"

E por todos esses anos venho pensando nessa história. Já desisti de martelar a fé cristã há anos e esse passo apenas engrossou a minha dúvida e alimentou minha vontade de escrever a respeito. O vilão que se salva sem mesmo perceber o quão era mal? O facínora que é inocentado e vive melhor que suas vítimas? 

Dias atrás me veio a vontade então de ligar de alguma forma esse pensamento com a máxima do ateísmo pragmático: "Se existe inferno, existe céu". Estou meio obcecado com a vontade de ligar essas duas coisas numa história. (acabei de ter um dejá vu...). Não sei exatamente como nem quanto tempo vou levar até que a ideia surja (ou que eu sente para forçá-la a surgir), mas sei que vou escrever no formato de um conto de cinco laudas como é padrão dos prêmios e concursos.

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